Com quantos símbolos se faz uma casa?

Certa vez, li em um artigo o quão recorrente era a figura da casa nos desenhos de crianças e idosos. A interpretação desse fenômeno, entretanto, não era consenso entre os psicanalistas: enquanto para alguns a imagem remetia ao desejo de regresso ao ventre materno e ao arquétipo da Mãe, outros defendiam que o desenho da casa pulsava significados próprios – ele representaria o íntimo, o calmo e o refúgio.

Se a casa habita o nosso inconsciente como o símbolo do aconchego e do acolhimento, seria no mínimo insensato encará-la apenas como morada. O local no qual nos recolhemos é muito mais do que um terreno com baldrames, tijolos e que recebeu encanamento e pontos de luz. A casa é uma extensão do nosso interior, espaço que conforta o corpo cansado, guarda bem mais do que o essencial e se abre somente quando autorizado. Há, portanto, uma relação intima entre morar bem e estar bem.

Assim como a imagem da casa flutua entre o plano físico e o plano simbólico, eu também habito duas casas: uma real e outra imaginária. Minha casa real era a até pouco tempo um apartamento de 40 metros quadrados que, como todo espaço pequeno, orgulha-se de ser bastante funcional.

“Embutido” era a palavra de ordem por essas bandas, sendo seu maior representante o Compact Pocket Model 1.200, que é uma combinação de armário de cozinha, frigobar, fogão elétrico e cuba. Porém, a falta de espaço não intimida as plantas e as lembranças de viagens que moravam por lá, como uma colcha da comunidade ribeirinha de Ubatuba e uma miniatura do Caminito, o bairro de Buenos Aires.

Já minha casa imaginária é o espaço no qual pretendo viver no futuro. Ela está localizada numa vila, tem piso de madeira de demolição e uma cristaleira rústica com o antigo aparelho de jantar da minha bisavó. A sala mantém os tijolos à mostra e a cozinha é decorada com azulejos portugueses azuis. Uma porta nos fundos leva ao quintal, que possui horta de temperos, banco de madeira para as noites de viola e jardim.

Seu tamanho, entretanto, ainda é pequeno: cabe nas margens de um desenho. Mas como todo desenho, ela definitivamente representa muito mais do que aparenta.

Sou Leonardo Valle, o novo repórter da revista Casa & Decoração. Acabei de voltar de Bauru, interior de São Paulo, para me reajeitar na capital, cidade onde nasci. Estou à procura de um novo lugar, talvez não minha casa imaginária, mas um apê onde bem-estar e felicidade não sejam nada compactos. A foto desta sala com divã é de Sidney Doll. Escreva-me: portaldecoracao@editoraonline.com.br

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